Eli Lopes da Silva[1]
1 Introdução: os
Cursos Superiores de Tecnologia (CST) – criação e diretrizes
A resolução
CNE/CP número 3, de 18/12/2002, disponível no endereço eletrônico http://portal.mec.gov.br/cne/arquivos/pdf/CP032002.pdf,
é o instrumento legal que reconhece os Cursos Superiores de Tecnologia (CSTs)
como cursos de graduação. A resolução prevê que este tipo de curso deve atender
demandas do cidadão, da sociedade e do mercado de trabalho. O documento que
apresenta as diretrizes em relação aos conteúdos curriculares, carga horária mínima
e infraestrutura para os CSTs é o Catálogo
Nacional de
Cursos Superiores de Tecnologia.
O Curso
Superior de Tecnologia, além de fornecer subsídios práticos para inserção no
mundo do trabalho, deve formar cidadão com base teórica sólida o suficiente
para que o egresso seja capaz de aprender a aprender, de ter ciência das ações
que executa e de ter condições de fazer pesquisa.
Os cursos
de pós-graduação lato sensu possuem o
funcionamento definido pela Resolução nº. 1
de 8 de junho de 2007. Importante destacar que estes cursos podem ser oferecidos
por instituições de Educação Superior credenciadas pelo MEC/INEP e que são
independentes de autorização, reconhecimento e renovação de reconhecimento.
Entendemos
que ambos, Cursos Superiores de Tecnologia e Pós-graduação lato sensu têm a função de formar cidadãos que possam atuar no
mercado de trabalho e que, sobretudo, sejam críticos de suas ações, éticos e
competentes. Para tal propósito, os conteúdos curriculares não podem se
restringir a fórmulas de execução de tarefas, mas fundados na relação
intrínseca, indissociável mesmo, que existe da teoria com a prática.
2 Teoria e prática na
Educação Superior
Existem pesquisas produzidas unicamente através de
estudos exploratórios, com grau zero de teorização, como se bastasse observação
ao acaso para entender criticamente a realidade. Nestes casos, o que temos é a
prática pela prática somente. Acreditamos que ”A teoria se torna necessária,
queiram ou não os defensores da universidade operacional, na medida em que nem os dados são sinônimos de
conceitos/categorias nem os termos são expressão direta e imediata dos
conceitos.” (JANTSCH, 2008, p. 50, grifo do autor). Luna (2010) afirma que
a teoria serve a dois propósitos: 1) aponta lacunas, frestas, em nosso
conhecimento da realidade e indica possíveis problemas de pesquisa para que
possamos buscar este conhecimento; 2) serve, ainda que de forma parcial, como
referência explicativa dos resultados observados. Por estas razões, a teoria é um
filtro pelo qual o pesquisador enxerga a realidade.
Geralmente procuramos enxergar a realidade do ponto de
vista do referencial teórico que temos, ou seja, a partir daquilo que temos em
mente ou naquilo que acreditamos. A teoria nos fornece subsídios, como se
fossem óculos, com os quais vemos o mundo que nos cerca. Neste sentido, a
afirmação de Luna (2010, p. 35) que “É tão improvável que um psicanalista
cogite os efeitos da estrutura cognitiva de uma criança sobre seu desempenho,
quanto um piagetiano procurar levantar informações sobre a resolução do
complexo de Édipo das crianças que estude.” nos chama a atenção para o fato que
a nossa forma de ver e entender o mundo tem um forte vínculo com aquilo que já
pensamos sobre ele.
Os conceitos que formamos em nossa mente dependem de
nossas experiências prévias e de nosso conhecimento teórico. Um conceito é uma
palavra que expressa a abstração de um fenômeno ou objeto. Entretanto, “embora
o conceito seja normalmente indicado por um nome, ele não é o nome” (MARTINS;
THEÓPHILO, 2009, p. 33). Portanto, a noção de conceito praticamente confunde-se
com a noção de significado. Como o significado depende não apenas de
interpretação, mas de como ele foi elaborado, um objeto ou fenômeno pode ter
significados diferentes conforme visões diferentes de mundo são aplicadas ao
objeto. Dito de outra forma, expressa quais teorias lhe serviram de base.
Uma teoria pode ser concretizada
em diversas práticas, que podem até mesmo parecer contraditórias. Um exemplo
disto é a Bíblia. Quantas religiões, com práticas muito diferentes, se fundaram
nela? A prática, por sua vez, é uma opção da teoria e, por este motivo, ela é
uma redução da teoria a um determinado contexto, dando a ela um caráter
limitante. Já a teoria, como apontam Martins e Theóphilo (2009) contém elementos
utópicos que, por isso, podem ser irrealizáveis historicamente. A prática é ideológica
e, como tal, é realizada dentro de uma opção política. Assim, a realidade
social é fundamentalmente prática e instrinsicamente ideológica.
Em resumo, o objetivo da teoria é a reconstrução conceitual das estruturas
objetivas dos fenômenos com o propósito de compreender e explicar esses
fenômenos. O objetivo da teoria na
pesquisa é orientar a busca dos fatos, estabelecer critérios para observar
e também para buscar respostas (MARTINS;
THEÓPHILO, 2009).
3 Pesquisa na Educação
Superior
Os cursos
de pós-graduação stricto sensu, que são
os mestrados e doutorados, normalmente formam pesquisadores que, para conclusão
e recebimento de diploma, defendem suas dissertações (no caso dos mestrados) ou
teses (no caso dos doutorados). Por outro lado, qual a responsabilidade,
comprometimento ou envolvimento dos CSTs e das pós-graduações lato sensu com a pesquisa?
Os CSTs são
construídos com base em recorte de uma grande área de conhecimento e, por este
motivo, possuem em sua natureza competência para formar cidadãos especialistas
(e não generalistas) em subáreas do conhecimento. Tomemos como exemplo a área
da Administração. Ao invés de formar um sujeito generalista com os vários
conhecimentos que a área envolve – o que é função, diga-se de passagem, muito
bem realizada pelos cursos de bacharelado – o CST opta por fazer a divisão em
especialidades como Processos Gerenciais, Gestão Financeira, Gestão de Recursos
Humanos, entre outras. Em outro exemplo, podemos dizer o mesmo da área de Ciências
da Computação. Um bacharel egresso deste curso tem conhecimento sobre programas
de computador, banco de dados, desenvolvimento de sistemas para web, redes de computadores e outros
tantos. Já um CST se preocupa em formar especialistas nestas áreas, como um
Tecnólogo em Redes de Computadores, Tecnólogo em Sistemas para web e assim por diante. Portanto,
forma-se um cidadão especialista naquela no recorte da grande área. Por este
motivo, tanto aprofundamento teórico dos conteúdos trabalhados quanto a aplicação,
dão plenas condições aos alunos de fazer pesquisa durante a graduação, visto
que a formação não se concentra apenas na prática.
3.1 A formulação do projeto de
pesquisa: etapas
Goldenberg (2000) apresenta
algumas etapas que devem ser consideradas na formulação de um projeto de
pesquisa:
- Delimitar
o problema dentro de um campo de estudo: é preciso definir um foco da pesquisa.
O problema não pode ser genérico ou abrangente demais.
- Reduzir a
tarefa de pesquisa ao que o pesquisador é capaz de realizar: a maioria dos
pesquisadores tende a querer “abraçar o mundo” com sua pesquisa. Ao delimitar o
campo de estudo, deve-se pensar também em como delimitar as atividades que se
propõe a executar na pesquisa, para que o pesquisador não se veja frustado por
não dar conta de fazer tudo aquilo que planejou. É preciso ter pé no chão com a
proposta.
- Evitar
coleta de dados que favoreça a uma determinada solução: é comum o pesquisador
ir a campo já com uma ideia fixa do que vai encontrar e, muitas vezes, esta
fixação turva a visão do pesquisador. Se o pesquisador vai a campo já com a
intenção de provar algo, independente do dado que vai coletar, não tem sentido
a coleta. É preciso que o pesquisador esteja aberto ao que vai encontrar na
coleta, mesmo que a descoberta esteja na contramão do que ele esperava ver.
- Definir
os conceitos a serem utilizados: atentar-se aos conceitos-chave da pesquisa. É
importante defini-los com clareza tanto para o leitor do trabalho, quanto para
o próprio pesquisador, que precisa saber do que está falando. A definição de
conceitos é um elemento fundamental para que o pesquisador consiga estabelecer
os limites daquilo que vai tratar, ou o campo de atuação da pesquisa.
- Prever as
etapas do processo de pesquisa, ainda que precise reformulá-las. O pesquisador
não deve se envergonhar de refazer o planejamento da pesquisa.
3.2 A
formulação do projeto de pesquisa: objetivos - geral e específicos
Na formulação
de projeto de pesquisas temos nos deparado, muitas vezes, com objetivos específicos
que vão muito além daquilo que foi proposto no objetivo geral. É quase como se
alguém tivesse escrito o objetivo geral e outra pessoa os específicos. O contrário,
embora em menor volume, também temos observado: objetivos específicos aquém
(que não dão conta) do objetivo geral. Tem sido mais comum o primeiro caso, ou
seja, o pesquisador pecar por excesso na escrita dos objetivos específicos.
O objetivo
geral de uma pesquisa está relacionado à questão principal da pesquisa, ao
problema a ser resolvido. O objetivo geral surge de uma pergunta de pesquisa
que instiga o pesquisador a procurar uma resposta.
Os
objetivos específicos estão relacionados às questões secundárias que serão
respondidas para dar conta de resolver a questão principal, ou o objetivo
geral. Um cuidado que se deve ter é que os objetivos específicos não podem ir
além e também não podem estar aquém do objetivo geral. É erro comum o
pesquisador escrever nos objetivos específicos ações que, se forem
concretizadas na prática, vão além do necessário para resolver o problema
principal da pesquisa. Quando isto acontece, é preciso rever o objetivo geral,
de maneira que ele agregue os objetivos específicos propostos ou então retirar
dos específicos as ações que estão “sobrando”. Cada objetivo específico deve
ser pensado à luz da seguinte pergunta: O que fazer para alcançar o objetivo
geral proposto?
4 Conclusão
Os Cursos Superiores
de Tecnologia (CSTs) são recortes de áreas de conhecimento e, por este motivo,
formam cidadãos especialistas, ao contrário dos bacharelados, que formam
generalistas. Ambos possuem seu valor no mercado de trabalho. Aquele que
procura um CST precisa estar ciente, ao contrário do que alguns pensam, que não
são cursos somente práticos, mas que, como qualquer formação, apresentam
propostas de aprofundamento teórico na área de conhecimento ao qual estão
vinculados. As pós-graduações lato sensu,
embora também estejam alinhadas ao mercado de trabalho e com a preocupação de
formar especialistas, têm a responsabilidade de aliar teoria, prática e
pesquisa.
Pesquisar
requer muito esforço, perseverança e busca de conhecimento do tema da pesquisa.
O pesquisador precisa definir muito bem seu objeto de estudo, traçar seus objetivos,
estabelecer os limites conceituais, aprofundar no referencial teórico e buscar
coletar dados para confrontá-los com estes referenciais.
Teoria, prática
e pesquisa são elementos que deveriam, no nosso entendimento, serem
ingredientes indispensáveis na formação superior.
REFERÊNCIAS
JANTSCH, Ari
Paulo. Os conceitos no ato teórico-metodológico do labor científico. In:
BIANCHETTI, Lucídio; MEKSENAS, Paulo. (Org.). A trama do conhecimento: teoria,
método e escrita em ciência e pesquisa. Campinas, SP: Papirus, 2008. p. 43-55.
LUNA, Sérgio V.
de. O falso conflito entre tendências metodológicas. In: FAZENDA, Ivani.
(Org.). Metodologia da Pesquisa Educacional. 12. ed. São Paulo: Cortez,
2010. p. 23-37.
MARTINS, Gilberto
de Andrade; THEÓPHILO, Carlos Renato. Metodologia da investigação científica
para ciências sociais aplicadas. 2. ed. São Paulo: Atlas, 2009.
[1]
Mestre em Educação (PUC Minas). Bacharel em Ciências da Computação (PUC Minas).
Avaliador de cursos pelo MEC/INEP.
Editor científico da revista NAVUS (navus.sc.senac.br). Docente de cursos superiores
e pós-graduação do Senac/SC.
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